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15/03/23 - 0 Comentários - por: EXCELÊNCIA EDUCAÇÃO

Regime sancionador de licitantes e contratados nas estatais: o que podemos utilizar da NLLC como modelo referencial?

Regime sancionador de licitantes e contratados nas estatais: o que podemos utilizar da NLLC como modelo referencial?

Por Viviane Mafissoni

Introdução


Em que pese saibamos que a
Lei nº 13.303/2016 (Lei das Estatais) possui regime jurídico próprio de aplicação de penalidades aos contratados e de que a mesma não resta afetada com a vigência da Lei nº 14.133/2021 (Nova Lei de Licitações e Contratos) – NLLC, existem novas referências no processo sancionador da NLLC que podem e merecem ser utilizadas pelas estatais em seus regulamentos, vez o tamanho da evolução normativa sobre a temática.

Claro, muita calma nessa hora! Reitero que a NLLC não é aplicável às estatais e reforço que referidas empresas possuem um grande poder regulamentar previsto na própria Lei que as rege, que muitas já se utilizam, e outras, nem tanto.

Aproveito essa resenha para trazer uma análise geral do regime sancionador das estatais, em comparativo com as principais inovações da NLLC na temática, finalizando com a provocação sobre a regulamentação de novidades nas estatais.

  1. O regime sancionador da Lei das Estatais: breves apontamentos

No que se refere ao regime de aplicação de sanções previsto na Lei nº 13.303/2016, não tivemos inovações em relação ao já previsto na então Lei nº 8.666/1993. Uma pena, já que se trata de uma Lei tão evoluída em outros aspectos. Na verdade, se manteve a escassa previsão normativa, apenas com a definição das sanções (excluindo a declaração de inidoneidade), regras de multa moratória e compensatória e previsão de prazo de defesa. Manteve a sanção de advertência, tão criticada sua efetividade ao longo dos anos.

As regras vão do artigo 82 ao 84. Enquanto o artigo 82 regula a multa de mora, o §1º do artigo 83 fala da multa compensatória, destacando que se a multa aplicada for superior ao valor da garantia prestada, além da perda desta, responderá o contratado pela sua diferença, que será descontada dos pagamentos eventualmente devidos pela empresa pública ou pela sociedade de economia mista ou cobrada judicialmente. Já o §2º traz a regra sobre a possiblidade de cumulação da sanção de multa com a advertência e a suspensão.

O caput do artigo 83[1] destaca as sanções com impactos em condutas praticadas na relação contratual. E as sanções são as seguintes: advertência, multa e suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar com a entidade sancionadora. O prazo da sanção restritiva não pode ser superior a 2 anos. E por que frisar o impacto das sanções na relação contratual? Porque o caput do artigo 83 diz o seguinte: Pela inexecução total ou parcial do contrato a empresa pública ou a sociedade de economia mista poderá, garantida a prévia defesa, aplicar ao contratado as seguintes sanções:..”. Ou seja, fala na inexecução contratual, permanecendo a celeuma de discussões que até hoje permeiam também sobre o disposto no caput no artigo 87 da Lei nº 8.666/93.

Seguindo, numa lógica similar ao artigo 88 da Lei nº 8.666/1993, o artigo 84 da Lei das Estatais destaca que a sanção de suspensão poderá também ser aplicada a empresas ou aos profissionais que, em razão dos contratos regidos pela Lei tenham sofrido condenação definitiva por praticarem, por meios dolosos, fraude fiscal no recolhimento de quaisquer tributos; tenham praticado atos ilícitos visando a frustrar os objetivos da licitação; ou demonstrem não possuir idoneidade para contratar com a empresa pública ou a sociedade de economia mista em virtude de atos ilícitos praticados.

Nesse contexto, um mundo de possibilidades se abre, permitindo, inclusive, a lógica da aplicação da sanção de suspensão para casos de condutas ocorridas durante o procedimento licitatório, enquadrando uma infração de não entrega de documento de habilitação, por exemplo, no inc. II do artigo 84 (tenham praticado atos ilícitos visando a frustrar os objetivos da licitação).

A Lei não traz procedimento e não descreve quais são as infrações. Gerando mais celeuma e dúvida e obrigando, por conseguinte, gestores se posicionarem em seus editais e contratos (e regulamentos) sobre quais são essas infrações passíveis de sancionamento, usando da razoabilidade e proporcionalidade.

A norma prevê ainda a amplitude da sanção restritiva, que será no âmbito da entidade sancionadora (artigo 83, inc. III).

  • As novidades no regime sancionador de licitantes e contratados na NLLC

O regime sancionatório da Lei nº 14.133/2021 – Nova Lei de Licitações e Contratos – NLLC – traz previsões especiais em relação às normas vigentes: a vinculação das infrações às sanções, a previsão de regras de procedimento, a desconsideração da personalidade jurídica, traz requisitos de reabilitação e aciona a assessoria jurídica a se manifestar em pelo menos 3 ritos procedimentais.

Sobre as espécies de sanções, a NLLC extingue a sanção de suspensão temporária de participação em licitações e impedimento de contratar com a Administração por prazo não superior a 2 anos constante do artigo 87, inc. III da Lei nº 8.666/1993 (e idêntica à sanção prevista na Lei das Estatais, conforme já destacado), prevendo a advertência, a multa, o impedimento de licitar e contratar da Lei nº 10.520/2020 – Lei do Pregão – e a declaração de inidoneidade.

Os parágrafos 2º, 3º, 4º e 5º do artigo 156 tratam da vinculação da infração ao tipo de sanção a ser aplicada. Ou seja, expressamente comunica a infração ocorrida com a sanção a ser passível de aplicação pelo gestor, oferecendo transparência, razoabilidade e proporcionalidade na aplicação das sanções. Facilitando, e muito, a dosimetria das sanções. Dificuldade hoje vista como uma das piores para avaliação no processo sancionador.

Sobre o procedimento sancionador em si, o artigo 158 da Nova Lei, moderniza o tratamento desse processo. Em resumo, regulamenta: a necessidade de instauração de processo de responsabilização; de constituição de comissão formada por no mínimo 2 servidores estáveis em caso de órgão composto por servidores estatutários ou, no caso de órgão não composto por servidores estatutários, formada de 2 (dois) ou mais empregados públicos pertencentes aos seus quadros permanentes, preferencialmente com, no mínimo, 3 (três) anos de tempo de serviço no órgão ou entidade; de providências de intimação para manifestação do licitante ou contratado em 15 dias úteis; da oportunidade de solicitação do licitante ou contratado para produzir provas; e, do deferimento do pedido de produção de provas ou com provas juntadas pela comissão, o dever de proporcionar ao interessado a apresentação de alegações finais no prazo de 15 (quinze) dias úteis. Reforçando que a obrigatoriedade de instauração de processo e de designação de comissão é retratada para apenas as sanções restritivas de licitar e contratar (impedimento e suspensão).

Ainda, nas inovações, o artigo 160 formaliza a desconsideração da personalidade jurídica, destacando que poderá ser desconsiderada sempre que utilizada com abuso do direito para facilitar, encobrir ou dissimular a prática dos atos ilícitos previstos na Lei ou para provocar confusão patrimonial, e, nesse caso, todos os efeitos das sanções aplicadas à pessoa jurídica serão estendidos aos seus administradores e sócios com poderes de administração, a pessoa jurídica sucessora ou a empresa do mesmo ramo com relação de coligação ou controle, de fato ou de direito, com o sancionado, observados, em todos os casos, o contraditório, a ampla defesa e a obrigatoriedade de análise jurídica prévia.

A última previsão em matéria sancionadora na NLLC é a do artigo 163 que prescreve regras sobre a reabilitação, antes pouco tratada na Lei nº 8.666/1993 e praticamente não utilizada em razão de escassa previsão normativa e dificuldade de compreensão do procedimento. A possibilidade de reabilitação está ligada a necessidade da observância de exigências cumulativas, sendo a especial delas a obrigatoriedade de transcurso mínimo de 1 ano da sanção de impedimento e de 3 anos no caso da aplicação da sanção de inidoneidade. Ou seja, a reabilitação se mostra possível tanto para o caso da imposição da sanção de impedimento como para a sanção de declaração de inidoneidade, desde que se tenha cumprido, entre outros, com os prazos mínimos de sanção estipulados. Por conseguinte, prevê que para a utilização do instituto exista análise jurídica prévia, com posicionamento conclusivo sobre o cumprimento dos requisitos de reabilitação, a reparação integral do dano causado, o pagamento da multa e o cumprimento de demais condições previstas no ato punitivo.

Finalizando sobre as novidades, importante papel da assessoria jurídica também é exigido previamente a aplicação da sanção de declaração de inidoneidade, além, é claro, de seu papel junto a decisão de desconsideração da personalidade jurídica e o cumprimento dos requisitos de reabilitação, conforme já destacado.

  • O regulamento da estatal e a possibilidade de previsão de novidades no rito sancionador

Conforme artigo 40 da Lei nº 13.303/2016, as empresas públicas e as sociedades de economia mista deverão publicar e manter atualizado regulamento interno de licitações e contratos, compatível com o disposto na Lei, especialmente quanto a matéria referente à aplicação de penalidades a licitantes e contratados.

E como destaquei, a NLLC trouxe diversas inovações no procedimento sancionador que, apesar de não se vincularem às Estatais, poderão ser internalizadas em seus regulamentos internos de licitações e contratos, adequando-se suas disposições às necessidades de cada entidade, evitando-se, contudo, a previsão de disposições que conflitem com a Lei das Estatais.

Existe espaço para rito de reabilitação, para rito de desconsideração da personalidade jurídica e para rito procedimental. Por que não criar uma comissão permanente para avaliação das infrações? Por que não capacitar servidores para atuação constante no processo de aplicação e penalidades?

Conclusão

Acredito que a discussão acaba por ir em direção da “mudança de cultura”. Principalmente em aceitar que a Lei n° 13.303/2016 pode existir, por si só, sem depender de outros normativos. Entretanto, há necessidade de se evoluir, de considerar no rito sancionador como organizador do mercado e da seleção de fornecedores, assim como ferramenta para análise nos planejamentos de contratações.

Há de se acreditar no rito, prever regras claras, criar estruturas de análise do procedimento, capacitar, prever mecanismos alternativos de aplicação de sanção, já difundidos em normas vigentes que regulamentam as infrações e sanções com base da NLLC.

Para tanto, é essencial que as Estatais possuam regulamento interno de licitações e contratos constantemente atualizado, de forma que possam apresentar inovações que acarretem maiores ganhos à Administração, em especial de eficiência e efetividade, ou até mesmo para que possam acompanhar possíveis melhorias propostas na legislação geral.


[1] Art. 83. Pela inexecução total ou parcial do contrato a empresa pública ou a sociedade de economia mista poderá, garantida a prévia defesa, aplicar ao contratado as seguintes sanções: (Vide Lei nº 14.002, de 2020)

I – advertência;

II – multa, na forma prevista no instrumento convocatório ou no contrato;

III – suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar com a entidade sancionadora, por prazo não superior a 2 (dois) anos.

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